Entenda sobre Engenharia e Manutenção Hospitalar
Confira entrevista feita pela jornalista Alessandra Franco para a Revista Visão Hospitalar – FBH com Fumio Araki, Especialista em Administração Hospitalar – Faculdade de Saúde Pública/USP, Especialista em Segurança do Trabalho – UNICAMP e Graduado em Engenharia Civil – UNICAMP:
1) Quais são os preceitos / requisitos principais da Engenharia e Manutenção Hospitalar?
A Engenharia e Manutenção Hospitalar, normalmente, está vinculada à Administração Geral do Hospital, e tem como incumbência principal manter em perfeito funcionamento as instalações e equipamentos. Além disso, deve participar ativamente de estudos e planejamentos de reformas, ampliações, e de novas aquisições de equipamentos assistenciais de saúde.
O hospital é uma eterna obra, que deve ser projetada e executada de acordo com as normas do Ministério da Saúde, e também, de outras normas vigentes.
A Engenharia e Manutenção Hospitalar deve ser composta por profissionais especializados e treinados, em função de sua enorme responsabilidade e diversidade das áreas técnicas e administrativas em que atuam. É responsável por toda a infraestrutura hospitalar tais como: edificação (projeto, construção e manutenção), instalações (elétrica, hidráulica, ar condicionado, gases medicinais, etc.), obras e reformas (predial e instalações).
A Arquitetura Hospitalar cuida do planejamento arquitetônico atendendo aos requisitos de: Expansibilidade (que prevê crescimento em etapas), Flexibilidade (com modulação e padronização), Racionalização (de energias e de insumos) e Humanização dentre outros itens importantes.
Atua na elaboração de projetos legais e executivos (cumprimento de normas: RDC-50, NBR, CNEN, etc.); otimização do espaço físico; estudos de fluxos de pessoas, materiais e equipamentos; especificações de materiais de acabamentos; gerenciamento de obras e reformas, etc.
A Engenharia Biomédica e Engenharia Clínica cuidam basicamente de: gerenciamento de manutenção dos equipamentos médicos; inventários e cadastramentos dos equipamentos; elaboração de normas, padrões técnicos e rotinas de manutenção; organização de arquivos técnico : manuais, catálogos e normas; estudos para reposição e substituição de equipamentos obsoletos; assessoramento na aquisição de novos equipamentos; treinamentos periódicos aos usuários de equipamentos; cadastro de fornecedores e prestadores de serviços de assistência técnica; monitoração de custos da gestão de manutenção de equipamentos médicos.
A Manutenção Hospitalar é o conjunto de trabalhos para manter todo o sistema hospitalar, prédios e equipamentos, em perfeitas condições de funcionamento de maneira a proporcionar aos pacientes as condições necessárias para o seu restabelecimento e conservação de sua vida.
Podemos dizer que hoje é impossível um hospital oferecer um elevado padrão de atendimento ao paciente se o serviço de manutenção não for eficiente. Uma falha num equipamento como aparelho de anestesia, aparelho de raio-x, grupo gerador, aparelho de respiração artificial e etc., pode comprometer a vida do paciente e a imagem do hospital. Da mesma forma, instalações prediais que não estejam em bom estado de conservação comprometem seriamente a segurança e a integridade física dos pacientes, médicos, e funcionários do hospital. Para que o serviço de manutenção seja eficiente num sistema hospitalar há necessidade de planejamento, ou seja, a manutenção deve ser planejada desde o início de funcionamento do hospital.
2) Quais os principais fatores que levam o hospital a ter uma boa Engenharia e Manutenção? (em termos de equipe, de cuidados, de controle, de prédios, de equipamentos, e demais setores importantes.)
A necessidade da presença e participação de Engenheiros, Arquitetos e Tecnólogos no ambiente hospitalar tem se tornado cada dia mais evidente, face ao desenvolvimento acelerado das tecnologias médicas e de equipamentos hospitalares. Exigências cada vez maiores, em gestões de qualidade e de segurança aos pacientes, também são fatores fundamentais que contribuem e justificam esta necessidade.
A Engenharia, Arquitetura, e Manutenção Hospitalar, bem como as demais atividades de apoio, como Higiene, Lavanderia, SND (Serviço de Nutrição e Dietética), CME (Central de Material Esterilizado), etc., tem participação fundamental no Controle de Infecção Hospitalar e nos Processos da Segurança do Paciente.
A manutenção hospitalar visa, sobretudo, preservar as instalações e equipamentos de deterioração prematura através de serviços e intervenções sistemáticas que irão proporcionar o mais alto nível de otimização de funcionamento, com o mínimo de intervenções de caráter corretivo, garantindo à instituição hospitalar um contínuo desempenho de sua atividade-fim, com qualidade, segurança e funcionalidade. Confiabilidade e disponibilidade de sistemas e equipamentos num ambiente hospitalar podem significar a diferença entre a vida e a morte. Os equipamentos, aparelhos e instalações devem estar disponíveis para uso imediato, durante vinte e quatro horas por dia. A Manutenção Hospitalar é muito importante e muito complexa dada a diversidade de instalações, equipamentos, aparelhos e suprimentos existentes dentro de um hospital.
Uma manutenção planejada traz excelentes resultados tais como:
1) – Conservação de equipamentos e aparelhos com aumento de eficiência e vida útil, maior segurança e confiabilidade aos usuários, redução dos custos operacionais.
2) – Conservação das instalações prediais obtendo maior segurança e confiabilidade no funcionamento das diversas instalações especiais que fazem parte do sistema hospitalar tais como: gases medicinais, caldeiras, grupos geradores, ar condicionado, esterilização, etc.
3) – Facilidade no monitoramento de consumos diversos tais como: água, energia elétrica, óleo diesel, gases medicinais, e outros.
4) – Facilidade na previsão de estoques de peças de reposição e materiais de consumo.
3) O que o gestor e equipes precisam saber/dominar sobre o assunto?
O gestor e as equipes que compõem a Engenharia e Manutenção devem ter o comprometimento com a instituição hospitalar acima de tudo. Devem gostar do que fazem, e não simplesmente ter apenas um emprego. Devem conhecer minuciosamente o elevado grau de responsabilidade que carregam em suas mãos, pois estão atuando o tempo todo num ambiente em que se lidam com risco de morte de pacientes e, portanto, não há chances de errar. Um pequeno erro operacional pode colocar em risco a vida humana. Exemplo comum: um gerador que falha durante a falta de energia elétrica pode gerar óbito. Todas as especialidades da Engenharia e Manutenção Hospitalar são muito importantes: elétrica, hidráulica, mecânica, ar condicionado, gases medicinais, etc. Todo profissional de qualquer uma dessas áreas deve se especializar e ser treinado para atuar com segurança e conforme as normas do Ministério da Saúde e da ABNT, além de outras.
4) Quais os desafios que você enxerga na área de engenharia e manutenção hospitalar?
Temos no Brasil cerca de 6.500 a 7000 hospitais. Presume-se que apenas cerca de 10% desses hospitais têm em seu organograma um departamento de Engenharia e Manutenção bem estruturado. Dessa forma, é questionável e preocupante a qualidade de atendimento desses 90% dos hospitais que não podem oferecer o mínimo de segurança aos pacientes, enfermeiros e médicos por falta de manutenção adequada das instalações e dos equipamentos.
Infelizmente, a grande maioria dos hospitais tem pouquíssimos funcionários especializados e sem o conhecimento e a formação técnica necessária para cuidar de tudo que se refere à manutenção, ou seja, são ao mesmo tempo eletricistas, encanadores, mecânicos, marceneiros, técnicos de autoclaves e de gases medicinais, técnicos eletrônicos, etc., o que é humanamente impossível para estarem à altura para ministrar um trabalho de forma correta e segura. Daí a razão das ocorrências de graves acidentes e incidentes, muitos deles fatais, em instituições hospitalares.
Um dos grandes desafios que temos pela frente é de diminuir rapidamente essa carência de profissionais especializados e capacitados com criações de mais cursos específicos e direcionados no menor tempo possível para formar a maior quantidade de profissionais habilitados.
A carência por profissionais treinados e habilitados para atuarem com segurança em Engenharia e Manutenção Hospitalar é muito grande no Brasil como um todo. A tecnologia médica avança numa velocidade vertiginosa, com equipamentos cada vez mais modernos e mais potentes. Isso requer reciclagens e treinamentos constantes dos profissionais que operam e fazem a manutenção das infraestruturas prediais e instalações especiais para proporcionar as condições mínimas necessárias para o perfeito funcionamento desse parque tecnológico.
5) Hoje em dia a questão da sustentabilidade ambiental está em voga e necessita ter observância. Como você vê essa questão? E como os gestores devem se preparar para isso? Qual a principal preocupação que um gestor deve ter no cenário ambiental hoje em dia? Quais os projetos que a área tem dentro dos parâmetros de sustentabilidade (se existir o tema na Engenharia Hospitalar)?
Impactos ambientais de grandes proporções têm sido causados principalmente pelo uso indiscriminado dos recursos naturais pelo homem. A extração abusiva da matéria prima no processo de produção que consome elevada quantidade de energia e gera estrondoso volume de resíduos, é uma das maiores responsáveis por esses impactos ambientais.
“Os hospitais norte-americanos gastam cerca de US$ 8,5 bilhões por ano com energia, consumindo quase duas vezes mais energia por metro quadrado do que escritórios tradicionais. No Brasil, somente os hospitais são responsáveis por 10,6% do consumo de energia de uso comercial no País. (Fonte: Estudo da Consultoria KPMG)”
Algumas soluções imediatas para minimizar os riscos à saúde dos pacientes pelos diversos resíduos gerados em um hospital são: aquisições de equipamentos médicos que consomem menos energia, instalações de ar condicionado e sistemas de iluminação energeticamente mais eficientes e menos dependentes de fontes de energia fóssil.
É possível reduzir de forma bastante significativa os custos de energia elétrica através de medidas simples, com a utilização de novas fontes de iluminação e modernização de circuitos elétricos. Por exemplo, a utilização de energias elétricas fotovoltaicas.
Além disso, existem os programas de reciclagens que proporcionam a reutilização de cerca de 70% de materiais de obras evitando entulhos acumulados em aterros sanitários, reaproveitamentos de águas de enxágues das lavanderias hospitalares e de águas pluviais que reduzem drasticamente o volume de água enviada para a rede pública e várias outras medidas simples e baratas que podem minimizar os impactos ao meio ambiente.
Alguns hospitais aboliram o uso de mercúrio, que é altamente nocivo à saúde, em seus equipamentos de diagnósticos, e passaram a utilizar equipamentos digitais. Com isso houve redução considerável desse resíduo biológico que era despejado no lixo.
O gestor de Engenharia e Manutenção Hospitalar e suas equipes devem ter o pleno conhecimento e domínio dessas questões, participando de treinamentos constantes através de cursos de capacitação e de reciclagens.
6) Gostaria que falasse também do treinamento / curso do instituto sobre Engenharia. Se é um curso que está acessível aos profissionais de qualquer área de gestão hospitalar, se é realizado de maneira programática, quantas vezes por ano, etc.
Felizmente há um crescimento cada vez maior de cursos de extensão e de Pós-Graduação, simpósios, seminários, e congressos que tratam sobre a importância da Engenharia, Arquitetura, e Manutenção Hospitalar em nosso País. Porém, apesar de ocorrer esse crescimento não podemos comemorar, pois a grande carência de tais cursos ainda é um fato real no Brasil. Há necessidade de maior divulgação e de expansão desses cursos para suprir a demanda real existente.
O Curso de Extensão e de curta duração de Engenharia e Manutenção Hospitalar é acessível a todos os profissionais que atuam ou queiram atuar na área de Engenharia e Manutenção Hospitalar.
Por ser um curso livre, e de curta duração, é importante que o conteúdo programático seja elaborado de forma muito mais prática que teórica, para que permita ao participante aplicar imediatamente os novos conhecimentos adquiridos no seu cotidiano da vida profissional.
7) Você pode acrescentar mais informações que achar relevante também.
Considerações Gerais:
Conforme citado no início, cerca 90% do total de 6.500 a 7.000 hospitais existentes em nosso país não dispõem de um departamento de Engenharia e Manutenção Hospitalar devidamente estruturado em seus organogramas. Daí surge o questionamento: De que forma funcionam as instalações prediais e os equipamentos médicos nesses hospitais? E de que forma são atendidos, e quais os riscos que correm os pacientes, médicos e enfermeiros nessas instituições?
Diariamente vemos com muita indignação reportagens e matérias sobre pacientes que sofrem com atendimentos precários em muitas instituições de saúde por falta de infraestrutura adequada em nosso País. Assim, é possível que muitos desses pacientes morram não pela doença, mas sim por falhas operacionais humanas e por falta de condições mínimas adequadas de instalações e de equipamentos. Isso sem entrar no problema da falta de medicamentos.
Esses pacientes necessitam apenas de atendimentos minimamente adequados, em acomodações simples, limpas, camas hospitalares com roupas limpas, alimentações e medicamentos básicos, além de equipamentos médicos que funcionem com segurança. Camas hospitalares eletrônicas e sofisticadas e instalações luxuosas tornam-se até desnecessárias diante do quadro caótico e degradante que visualizamos diariamente. O que não pode continuar é o cenário de pacientes mal atendidos pelos corredores imundos e sem as mínimas condições de higiene nessas instituições de saúde.
Essas questões reais, normalmente, ficam no esquecimento e praticamente sem planos de ações, o que é lamentável. A busca de soluções para esses problemas, e o equacionamento dos gastos públicos necessários são, sem dúvidas, grandes desafios da nossa Saúde como um todo.
Não podemos ignorar também a tendência do encolhimento e envelhecimento da nossa população até o final desse século, que terá enorme influência no futuro da Saúde do Brasil.